Depois que o portão fechou o silêncio invadiu a casa e as lágrimas da mulher foram suavemente secando ao se misturar com a poeira levantada pela vassoura que de modo vagaroso passeava pelos cômodos.
Anestesiada com a dor da partida buscava enxergar nas palmeiras há pouco plantadas a beleza do verde e o cheiro bom da terra molhada. Sabia que no jardim, diariamente, poderia sentir a presença do seu amor e o toque lento dos seus lábios. Traria na lembrança a leveza do cheiro e a maciez do beijo que só se compara à roupa lavada pelas mães, à mão, e enxaguada no amaciante de cor azul.
Intuía que os dias iriam ser compassados a espera de ver o seu amor retornar de uma viagem que o calendário não marcava a data do regresso. Ela parou e pensou em escrever pela primeira vez um conto já que o conteúdo da saudade a cada amanhecer corroeria abruptamente a cor dos seus dias.
Conhecia pouco de si, mas tinha a certeza de que outras lágrimas viriam como sempre ocorrera durante toda sua vida. As lágrimas sempre tiveram presença certa em momentos de alegria ou de dor desde a infância. Sabia conviver bem com elas, pois a mesma facilidade que tinha para rir também possuía para chorar, todavia as lagrimas que escorreram antes do seu amor sair tinha um significado especial, dessa vez eram águas mornas e doces que escorriam pelo rosto tranqüilo de uma noite bem dormida.
Saboreou o choro de dor bem doida, mas esse choro não tinha tristeza, pois assim como era inevitável o derretimento do gelo, sabia que a distância que se iniciava hoje somente traria aproximação e aprofundamento das raízes do caule dessa relação que há dois meses crescia e se ramificava no solo.
Ela fechou os olhos e viu que os dias distantes engrossariam ainda mais a confiança, a cumplicidade, o desejo, o amor. Estava feliz apesar de saber que as semanas vindouras ofereceriam no cardápio apenas uma palavra como opção: “saudade”.